6/3/14

Questões filosóficas decorrentes das traduções das Teses sobre Feuerbach

Ludwig Feuerbach
✆ Nayer
Sílvio César Moral Marques  |  A publicação das obras de Marx sempre gerou controvérsias: por um lado as dificuldades advindas de sua caligrafia que alimentavam dúvidas quanto às palavras grafadas, por outro as ingerências em seus escritos com acréscimos e glosas realizadas, muitas vezes, para atender aos anseios ideológicos de seus editores e patrocinadores de suas ideias. Algumas tentativas foram realizadas para a edição das obras de Marx-Engels: a primeira se iniciou com Riazinov em 1927 e se encerrou em 1935 com 40 volumes previstos, dos quais somente 12 foram publicados (também conhecida por Marx-Engels Gesamtausgabe – ou MEGA 1); a seguir ocorrem as edições da Marx-Engels Werke editado na Alemanha Oriental; a partir dos anos 1970 inicia-se a edição de outra Gesamtausgabe (MEGA 2), agora com um aparato histórico-crítico e com previsão de publicação de 164 volumes. Em 1990 ocorre a mudança da editora Karl Dietz Verlag para a editora Akademie Verlag, com novos critérios editoriais. Seguindo as novas diretrizes, entre as quais a transcrição integral dos textos, a edição é reduzida para 114 volumes, dos quais 52 já se encontram publicados (40 pela Karl Dietz Verlag e 12 pela Akademie Verlag).

As Teses sobre Feuerbach foram escritas, ao que tudo indica, no mês de março de 1845 na cidade de Bruxelas num livro de notas (o primeiro de uma série de vinte cadernos que cobrem o período de 1844 a 1881), anotações estas que se referem a apontamentos pessoais,
além de pequenos textos sobre Hegel, a Revolução Francesa, Proudhon entre outros. O texto encontra-se entre as páginas 53 e 57 do primeiro caderno, e que foram, no dizer de Engels (1888) “[...] notas para desenvolvimento posterior, registradas rapidamente, em absoluto destinadas à impressão, mas de valor inestimável como o primeiro documento em que foi depositado o germe genial da nova concepção do mundo”. Este trabalho ficou inédito por mais de quatro décadas, somente vindo à luz em 1888 com alterações introduzidas por Engels para “ajudar/esclarecer” seu entendimento; vem daí também o título pelo qual ficou conhecido: Teses sobre Feuerbach (Thesen über Feuerbach) ao invés do título dado por Marx – Ad Feuerbach. O texto original, sem alterações, veio a público no ano de 1924 em uma tradução para o russo com fac-símile do manuscrito original. Talvez não seja descabido atribuir às teses o mesmo destino que Marx indicou para a obra A ideologia alemã (rejeitada para publicação por motivos alheios à vontade de seus autores e publicada somente em 1932): “deixamos voluntariamente o manuscrito à crítica roedora dos ratos, pois havíamos alcançado o nosso objetivo principal: a autocompreensão” (Marx, 1859).

A compreensão das próprias ideias refere-se, nas Teses, à superação das posições do materialismo e do hegelianismo a que Marx esteve, por vezes, ligado em sua juventude (Löwy, 2002, p.165), caminhando na direção da filosofia da práxis, com a qual irá romper com a tradicional separação entre teoria e prática adotada desde a antiguidade, e empreender uma severa crítica social e filosófica à sociedade. Neste sentido, apresentam diferentes níveis e elementos de interpretação, notadamente no que se refere aos aspectos epistemológicos, políticos e antropológicos (sobre estas questões ver: Bloch, 1959; Labica, 1987; Löwy, 2002; Bermudo, 1975; Nebreda, 2011, entre outros.)

O objetivo do presente estudo não é empreender uma análise/interpretação filosófica do texto – trabalho este já realizado em diferentes níveis e horizontes teóricos por inúmeros pensadores nos últimos cem anos –, mas antes apresentar as opções de possíveis traduções dos elementos desta obra, tentando explicar e explicitar os conceitos ali presentes que guiaram a tradução.
 

http://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/